Brisa de Primavera – Episódio 1 (estreia – Edição Especial)

Como tudo começou…

Cena. 01. Plantação. Tarde.

Ali, naquela pequena plantação de hortaliças no interior de Manaus, era possível ouvir uma voz, uma doce voz, que transformava aquele lugar tão simples em um ambiente mágico com simples cantigas. Era Luana, uma menina de 9 anos, alegre como nenhuma outra, mesmo fazendo duros trabalhos braçais. O sol intenso batia em seu rosto, o que nem a incomodava mais. É quando ela ouve uma voz.

Ramiro- Luana, por hoje chega, o tempo está fechando.

Luana- Já vou, papai.

Os dois sobem na carroça, tomando como caminho para casa uma estreita de terra batida.

Ramiro- Filha, já disse que não quero te ver faltando aula pra vim pra roça.

Luana- Ah, papai, a professora entende, não se preocupe. Estou estudando muito!

Ramiro- Só quero um futuro melhor pra ti e pro teu irmão, meu amor.

Os dois seguem o trajeto por alguns minutos, até que chegam ao sítio aonde residem.

Cena. 02. Sítio. Inicio de noite.

Era um local bastante simples, um humilde casebre envolto por árvores e poucos animais.

Luana está sentada no chão da sala, lendo alguns livros ilustrados com seu pequeno irmão, Josué, de apenas três anos. Enquanto seu pai apenas os observava pensando em tudo o que queria dar para os filhos e não pode. Dona Raimunda entra na sala.

Dona Raimunda- Já coloquei o jantar na mesa, vamos logo antes de esfriar.

A família se reúne em volta de uma mesa improvisada com um pedaço de tábua, o jantar era simples, basicamente um ensopado das hortaliças que os mesmos plantavam. Comeram sem trocar muitas palavras. Após o jantar, Luana vai para o quarto e coloca Josué para dormir, passado algum tempo ela começa a ouvir gritos vindos da sala, seu pai e sua mãe discutiam.

Raimunda- A situação não tá boa, quase não tem comida dentro de casa. Me diz! Quando?

Ramiro- Abaixa o tom, mulher! Tu, mais do que ninguém sabe que eu quero o melhor pros nossos filhos. (se acalma) Essa próxima colheita vai ser boa, vamos ajeitar nossas vidas, se Deus quiser.

Raimunda respira fundo, e entende o lado do marido, se abraça a ele e chora com a cabeça encostada em seu ombro.

Raimunda- Eu só quero que nossos filhos tenham o que nunca podemos ter. Desculpa.

Ramiro a abraça mais forte.

Ramiro- Eu também, meu amor, eu também.

Enquanto isso, no quarto, Luana acompanha atentamente a discussão, seus olhos ficam marejados com lágrimas. Agora ela sabia mais do que nunca que tinha que ajudar seu pai, aquela colheita tinha que dar certo, pois poderia salvar sua família.

Cena. 03. Plantação. Fim de tarde.

Meses depois…

Luana e Ramiro estão olhando para a plantação de hortaliças, satisfeitos, aquele pequeno pedaço de terra estava produzindo bem, estavam sorrindo, esperançosos para a colheita no dia seguinte.

Luana começa a sentir finas gotas de água acariciar seu rosto, o tempo estava ficando nublado, uma grande tempestade viria pela frente.

Os dois sobem na carroça e iniciam o trajeto de volta para casa. A cada cavalgada do cavalo que puxava a carroça a chuva ficava cada vez mais forte, até se tornar uma violenta tempestade, a terra da estrada ficou cada vez mais propícia a deslizes. Em alguns minutos Luana e Ramiro já estão bem próximos de casa, então, avistam algo fora do comum, não, não podia ser, como aquilo pôde acontecer justo naquele momento? Os dois avistavam Raimunda debaixo da intensa chuva, com Josué nos braços, aos prantos. Logo que olharam em direção a casa, viram o seus olhos não podiam acreditar, a cuva havia levado o telhado da casa, a essa altura estava tudo inundado pela água. Rapidamente, Luana salta da carroça e corre em direção a um pequeno deposito nos fundos da casa, de lá tira uma grande lona preta enquanto a chuva bate violentamente em seu rosto, ela grita pela ajuda do pai.

Luana- Paaaai. Ajuda aqui, segura do outro lado.

Ramiro atende prontamente, logo Luana sobe na casa e improvisa um telhado com aquela enorme lona preta. A família entra, Raimunda chorava muito pelo ponto em que a situação chegou, Ramiro não sabia o que pensar, apenas lamentar, Josué não entendia muito bem a situação, apenas a pequena Luana não perdia as esperanças, Luana vai em direção aos pais, segura as mãos dos dois.

Luana- Dias melhores virão, acreditem, isso tudo vai passar.

Os dois sorriem para a filha, emocionados. Logo todos foram dormir aos sons dos pingos de chuva batendo contra a lona.

Cena. 04. Casa de Luana. Dia.

Um novo dia nasceu, e junto com ele, nasceu também a esperança. Era, finalmente, o tão esperado dia da colheita. A situação financeira, enfim, melhoraria.

Luana levantou cedo, tomou apenas um gole de café, faltaria na escola mais uma vez, sentou no chão da sala e ficou ensinando algumas sílabas para seu irmão enquanto esperava seu pai sair do banho. Logo olha para a entrada do sitio e avista um homem alto, com cabelos negros e bem vestido se aproximando da porta, se deu conta de quem era, se tratava de seu tio Eriberto, irmão de sua mãe, com quem mantinha pouco contato. Dona Raimunda aparece na sala logo que seu irmão chega, e fica surpresa com a visita.

Raimunda (confusa)- Meu irmão, você por aqui? Não aparece aqui desde o nascimento do Josué.

Eriberto continua perplexo olhando a situação da casa, ficando calado por alguns segundos.

Eriberto- Minha irmã, aonde tu veio se meter? Olha a situação dessa casa.

Raimunda fica envergonhada, afinal, seu irmão era um homem bem de vida.

Eriberto- Já te convidei uma vez, e não hesito em fazer isso novamente, larga isso aqui, pega suas coisas, seus filhos, vamos lá pra casa, você pode arranjar um emprego na cidade. (Ele segura as mãos da irmã). E então, o que me diz?

Raimunda permanece imóvel, tentada com a proposta do irmão. No exato momento, Ramiro aparece na sala, ele e a esposa se encaram, ele espera uma resposta dela. Ela volta o olhar para o irmão, que logo entende a resposta negativa da irmã, ele respira fundo.

Eriberto- Pois bem, aceite pelo menos uma ajuda. (Diz ele, tirando uma boa quantia de dinheiro do bolso e estende a mão em direção a irmã). Pegue!

Luana, que observava toda a conversa, se levanta e diz em alto e bom tom:

Luana- Aqui nessa casa ninguém vai aceitar seu dinheiro sujo!

Eriberto se enfurece.

Eriberto- Olha que filha abusada tu criou, Raimunda. (Empurra Luana). Pega logo esse dinheiro.

Luana volta pra frente de Eriberto, impedindo a mãe de pegar o dinheiro.

Luana- Ninguém aqui vai aceitar dinheiro de contrabando. Ouviu? NINGUÉM! Todo mundo lá da cidade sabe que aquela mercadoria é ilegal. (Desafiadora)

Eriberto se exalta e levanta a mão para Luana.

Eriberto- Agora tu vais aprender a me respeitar, sua pivete!

Eriberto se prepara para bater em Luana, quando Ramiro se coloca entre os dois e segura a mão do cunhado.

Ramiro- Covarde nem um vai encostar as mãos na minha filha.(Aumenta o tom). COVARDE NEM UM. TA ME ENTENDENDO? Agora VAI EMBORA DAQUI antes que eu te dê uma boa surra!

Raimunda- Vai mano, depois conversamos.

Ramiro empurra Eriberto porta o fora, ele sai correndo do local.

Ramiro(Para Raimunda)- Não quero nem imaginar qual seria tua resposta pro teu irmão, nem quero imaginar!

Cena. 05. Estradinha em um lugar qualquer. Dia.

Passada a confusão, cabeças esfriadas, Luana e seu pai estão na carroça a caminho da horta, alguns trechos da estrada ainda estavam escorregadias, mas não importava, era o dia da “colheita salvadora”. Passados alguns minutos eles chegam à plantação, mas não encontraram o que tanto almejavam, a visão era desesperadora, a tempestade da noite anterior havia devastado boa parte da plantação, haviam restado poucas hortaliças, quase nada.

Ramiro desaba em lágrimas. Como poderia salvar sua família agora? Estaria tudo perdido?

Luana, de início se entristece, mas não se deixa abalar. Logo ela pega uma ferramenta e começa a colher as hortaliças que restaram, não eram muitas, mas seriam úteis, Ramiro se junta à filha, aos poucos vão recuperando tudo o que era possível. Um tempo depois a carroça estava lotada, Luana e seu pai estavam mais esperançosos, fizeram o que podiam, e tiraram um bom lucro dali.

Luana- É, nem essa forte chuva foi capaz de destruir nosso ganha pão. Parece que tem alguém lá em cima nos ajudando, hein, papai? (sorri alegremente).

Ramiro- Sim, filha, com isso aqui teremos o suficiente ao menos para consertar o telhado.

Eles sobrem na carroça e a tocam na estradinha de terra.

Cena. 06. Sítio. Dia.

Dona Raimunda e Josué estão na frente de casa esperando os dois virem da roça, é quando os avistam vindo no horizonte, se aproximando cada vez mais, quando absurdamente rápido uma das rodas da carroça desliza em um pedaço liso da terra, a carroça vira, o cavalo se solta do cabresto e sai correndo para o sítio, Luana pula antes da carroça virar e sai ilesa, já Ramiro machuca gravemente a perna, as hortaliças ficam espalhadas pelo chão, quebradas e machucadas. Raimunda corre para ajudar o marido, ele se apoia nela e os dois vão para casa cuidar do machucado. Josué corre em direção a irmã e se abraça às suas pernas, Luana deixa uma lágrima escolher e pega Josué no colo.

Luana- Maninho, vou precisar de você pra ajudar o papai, você me dá uma força, maninho?

Josué somente balança a cabeça, enxuga a lágrima e sorri para o irmão.

Cena. 07. Casa de Luana. Dia.

Raimunda termina de enfaixar os machucados do marido enquanto ele está indignado com o ocorrido.

Ramiro- Pronto, agora sim tá tudo perdido de vez. Minha nossa, o que vamos fazer agora?

Raimunda- Calma homem, posso pedir um dinheiro emprestado do Eriberto.

Ramiro- Mulher, tu vais mesmo aceitar aquele dinheiro que teu irmão ganha vendendo pirataria no porto e passando a perna nos turistas? E isso não é orgulho, mas ainda tenho meus princípios. Só tenho que pensar em como vamos sair dessa.

Luana aparece com um caixote de madeira em mãos.

Luana- Nem tudo está perdido papai, o Josué me ajudou a juntar as verduras caídas.(Diz ela empurrando a porta com o pé e mostrando mais alguns caixotes na frente de casa).

Ramiro sorri.

Ramiro- Você não existe, filha.

Os dois se abraçam.

Ramiro- Não vou perder tempo, vou à cidade vender isso agora. Fiquem aí os três, não demoro.

Raimunda- Mas e sua perna?

Ramiro- Já to até melhor, mulher! Haha

Diz ele, já pegando os caixotes e colocando na carroça antiga que tinham no depósito, logo prepara o cavalo, sobe na mesma e parte em direção a cidade.

Cena. 08. Cidade interiorana. Tarde.

Ramiro estaciona a carroça, coloca os caixotes dentro de carrinho de feira e parte para o mercadão, oferecendo suas hortaliças para vários feirantes, recebe vários “nãos”, mas depois de muito tempo e insistência consegue vender toda a mercadoria, caminhava, satisfeito, em direção ao seu transporte, mas a cada passo que dava percebia que estava sendo seguido, tentava andar mais rápido, porém, o machucado na perna não permitia, aos poucos percebia que eram vários que seguiam-no, vários marginais mirins cercavam-no. Enquanto mais andava, mais encurralado ficava, até que se esforça ao máximo para correr, dobra numa esquina, olhando para trás, em uma fração de segundos ele atravessa a rua e um carro que ia fazer a curva o atropela, jogando Ramiro para cima da calçada, inconsciente, o motorista foge sem prestar ajuda. Os trombadinhas que o seguiam aproveitam a situação e vasculham os bolsos dele, levando todo o dinheiro que ele havia acabo de conseguir, logo fogem e um aglomerado de pessoas se forma em volta do corpo.

Cena. 09. Sítio. Fim de tarde.

O sol está se pondo, vagarosamente a noite chega, Luana e Raimunda estão na sala, apreensivas, Ramiro demorava a chegar, mãe e filha temiam pelo pior. Uma viatura chega rapidamente ao sítio e estaciona. Dentro de casa, Luana e a mãe ouvem fortes batidas na porta. Logo as duas correm e abrem a porta, se deparando um policial alto e robusto.

Policial- A senhora é a mulher do Senhor Ramiro Carvalho dos Santos.

Raimunda (confusa)- Sim, sou eu mesma, aconteceu alguma coisa com meu marido?

O policial respira fundo, deixando mãe e filha ainda mais preocupadas.

Policial- Sinto lhe informar que seu marido sofreu um atropelamento na cidade, e não resistiu aos ferimentos, encontramos vocês com a ajuda de uns feirantes do mercadão que conheciam o falecido.

Luana e sua mãe ficaram ali paradas, em choque, não sabiam o que falar, o que pensar, o que fazer. Aquelas palavras foram como duas mãos que puxaram o chão que elas pisavam. Como será a vida da família agora sem o patriarca? O futuro a Deus pertence…

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